segunda-feira, dezembro 23, 2024

modelações XXXIII

 

 
A Palavra  adjectivos
 (Painel constituído por 8 quadros  40x50cm Anos 2000 
 

Abrindo a voz, ouço os recônditos objectos que nela falam; o obscuro silêncio é luminoso e a mão que o segura desenha os seus contornos;

 – ossos, abre na noite o tumulto dos olhos, despe o noivado dos encontros, respira fundo sobre o degredo – manhã, ó rosas desmaiadas nos jardins suspensos, canto dos canteiros cantando nos átrios das mansões, flor ou o delírio do envolto na penumbra do centro certo, para lá da pétala o adeus ao vento, ó sonho da noite que acorda – rosto, toda a navalha cinzelando o aberto, que dizer das pestanas vivas como agulhas, bocas como fogo nas mãos desertas, em ti sopram em tormenta os desígnios juvenis, e as faces dançam na madrugada dos sóis, despem-se em aromas os quase mudos sorrisos – verde, toda a árvore é um desejo, o chão vestido cantando, um avental cobrindo os nervos sedosos que no terreno esburacam – fósforo, lenta dor que vegeta no silêncio, pedra dos amantes que naufragam e se consomem na combustão dos olhares, rumores de um presente anoitecendo nas favelas os lumes dos vivos – tabuada, ó glória do saber abstracto e singelo, toada mortiça dos rabiscos nas ardósias, palmatórias subindo das entranhas como venenos da saudade – alecrim, diadema do fogo nas noites de camurça saltando à fogueira, tonturas do vento em vertigem romanesca, nas labaredas ouvindo os sustidos sons das lágrimas, o crepitar dos desvalidos e dos amantes

Na palavra o imenso apaixonado abre-se, fustiga o coração como o canto das canoras aves, busca o fazer das mãos enquanto os olhos ardem como cavalos nas montanhas – o óbvio é um objecto sem destino.

 

domingo, dezembro 08, 2024

Modelações XXXII

 

 
 Ilustração do conto «O Amor é uma Fuga sem Filme de Vitor Gil Cardeira

Desenho a tinta da china sobre papel (6/VIII) 42x30cm

 

Será um rosto ou uma paisagem onde os despojados olhos despistam os rumores da terra? – vejo os corgos na distância que anima os pesares da infância, solicitudes imemoriais dos tempos, zonas do silêncio dos arbustos aninhados às encostas, lugares dos bichos circulando de través aos atritos das circunstâncias, aves com alvoroço rondando sentimentais ninhos; os rostos circulam na paisagem abeirando-se dos seus desastres, ou das suas alegrias que por vezes circundam os nossos passos em diária circulação; as obras merecem os apreços dos peões que vão surgindo nas vertentes dos espaços abertos, chegam daqui e dali, ou partem para incomuns lugares do universo; – do universo? - as estrelas que habitam nas rugas dos nossas rostos desenham as via lácteas dos nossos celestiais corpos, sonegando ao império das dores os benefícios da morte prematura, aos seres vivos; os sulcos alvejando crispações aos olhares deixam o chão coberto de vertidas lágrimas, como cristais da sobrevivência; sulco o terreno pela mão do amor, nele liberto a verdade pungente do meu arbítrio; corro com mágoa atrás do verbo, e medito: – o pão que te alimenta cresce nos sonhos? as dores do parto e as convulsões das sementes abrem horizontes no alongamento dos dias, reverberando ânsias embora noturnas, alijam os detritos dos plásticos em combustão; as aparências moem os desejos espalhados nas maçãs envernizadas, nas roupagens ciumentas das modas, nas luzes dos palcos atormentados em viagens solenes, – ó cânticos das perturbadas lágrimas!