quinta-feira, março 24, 2022

Outro mundo é possível


 
Pôr do sol com amendoeiras em flor - 5 -
 Pintura à espátula - óleo sobre tela - 40x50
 2022

 

  - regresso à terra, eis a questão!... abraço sujeito à escuridão do tempo arranha o horizonte sem rumo, mingua dos calos da noite; pasme-se...! a amendoeira abandonada no verde campo como enterro do verbo no interior da casa, um osso salgado para roer ao amanhecer, um trilho de beijos afogados na macia noite...,   

 

Teu sol brilha cântico da terra

Num adeus de cios maduros

Aves de longínquas esferas

Perdidas traves doutros futuros

 

Teu laranjal de películas de sonho

Amêndoas das flores em botão

Dos casulos que fechados estão

Nimbo aberto –  palma da mão

 

Figueiras de um andaime de glória

Após a sombra do turbilhão das vestes

Abre as veredas desta ou outra vitória

Nos alísios dos ventos campestres

 

À entrada dos vultos ocasionais

Bálsamo de um verde limão

O rumo aberto dos laranjais

Adubos de poemas - irmãos

 

Terra mares amores cantigas

Sem fim de um adeus precoce

Beijando nos olhos dos jardins

As vestes das janelas antigas

 

Suave pouso da tua ansiedade

Nas lousas das alvoradas singelas

Passos cruzados sem eternidade

Deixando marcas pelas vielas

 

Oh desvelo de uma nação de vozes

 Rocio desbravado de medronhos

Leva teu cântico de suores velozes

Pelas estradas dos corpos estranhos

  

Verde timbre teu rosto aguçado

Verde estio soprando em botão

Deixa passar este e qualquer fado

Chegar volante à rubra emoção

 

Acaba a amargura em solo inerte

Os braços navegam no mar alto

- Deixa ao ópio que nos diverte

Um abraço do nosso sobressalto

 

 

descabeladas raízes anotam a sua vigência, o seu cunho material de crueza e ambição; jogo calibrado de raiva e crescimento, aguda vontade de subir ao palco; teatro vertiginoso da biosfera enlaçando os dedos das mãos  com as aves cuspidas das moléculas eternas; - atenção, pais dos abismos, mães da incerteza -, se vozes das circunstâncias adocicadas untando manteiga no pão ázimo..., a amendoeira reabre o seu cântico de maravilha e morte todas as primaveras.