terça-feira, fevereiro 28, 2017

os corredores habitados



Parto, nesta mão que tecla, na viagem para o outro lado; cada tecla, cada letra é um caminho, a porta aberta ao universo das paisagens, à regular agitação dos nomes, - vou pelo, v, em viagem; pelo a, em adeus; pelo, l, ao longe; o – a, é ainda o agora do – p que parte, do – o e l que assoma do - outro lado; caminho pelo som da música em que me oiço em cada soletrar manso no bater das teclas; l, de liberdade; f, de família; a de amurada; n, de nuvem, nuvens na vã tristeza da tarde esmorecendo; - mas a nuvem não é triste… é o manto colorido, a morrinha solene na tarde em, - dia que se esvai; a esplanada cinzenta do olhar onde fímbrias de sedosos alaranjados morrem no – l, ao longe do teclado, já na distinta dobra da penumbra dos montes, acendida a leveza húmida do deslizar dos dedos sobre a pele rugosa do laranja; n, - da noite; l, lado oculto da várzea à palma da mão, quebra arredondada deste horizonte literal e quedo de q, - que quero disperso e sentido  




domingo, fevereiro 26, 2017

ao espelho



ao espelho 

V

ao espelho no horizonte  do teu perfil descobres o rasto do desconsolado verbo
teu irmão nativo acossado pelas desventuras do medo
ao espelho teus olhos invejam as sedutoras planícies do esquecimento
frescura de raízes sentimentais no apocalipse dos astros e da miséria
ao espelho aguarelas de saudades mortas deixam consternadas as tuas pupilas



VI
ao espelho pelo itinerário do infinito reflexo da tua presença sulcando teu olhar
quadro petrificado pelas perguntas do teu carácter às verdades soltas por realizar
ao espelho odores da tua pele escurecem enfermidades de outras peles
ao espelho nos ombros dos teus pensamentos interrogas a escuridão dos cantos desta casa
vinculas  a distancia do teu pensamento ao silencio da tua imagem ali
ao espelho ouvem-se as citaras do teu olhar quando naufragado no vidro incorro na desordem



VII
ao espelho as palavras estão do outro lado do lado outro estão palavras as do espelho ao
encontro dos seus resíduos mortais palavra de pão dada aos olhos no espelho do teu aquário esqueleto o esqueleto no espelho devorando teu olhar na quietude singular do desalento teu ao espelho quietude de címbalos no olhar margens desta ficção teu dizer em argolas ricocheteando presságios ao espelho 




sexta-feira, fevereiro 24, 2017

os corredores habitados



haiku

a frágil beleza de um objecto feio
- balouçando a nua corda da forca


domingo, fevereiro 12, 2017

ao espelho



                                                             
                                                ao espelho


I

Ao espelho ouvem-se as citaras do teu olhar quando naufragado no vidro incorro na desordem
no realejo os cantares desesperam quando roucos os címbalos roufenham e assim viajo
do vidro digo a sua ausência a pequena loucura aglomerada no vértice do lugar
do lugar ausento os segredos refulgindo em esconsos armários

II

ao espelho ouvem-se as citaras quando naufragado no vidro incorro na desordem do teu olhar
guerreiro e arrebatado corro atormentado nas caves dos nossos espelhos
no planalto adormeço violador dos espelhos  de Epicuro

III

ao espelho ouvem-se as vozes alongadas das franzinas crenças soltando-se do teu regaço
nas esquinas do perfume  profanas  o vazio da tua voz com segredos sem memória
doutas datas no patamar da sabedoria derramam evidencias sobre os vidros espelhados

IV

ao espelho aguardas ver o teu silencio soltar-se do teu rosto
no teclado dos teus desgostos atrás de ti suspenso viajas nos vidros
janela que me prende ao chão de todas as palavras soltando-se dos nitratos da desordem